terça-feira, 26 de outubro de 2010

Chorumelas I

Sentado ao teu lado,
Seguro a tua mão sobre a mesa.
Quero te dar um beijo.
Mas então olho para tua boca cerrada,
E para teu olhar contrariado,
Iluminado pelas luzes da noite,
Que olha fixamente para bem longe.

Então eu tento me lembrar do teu sorriso,
E das vezes que tentei te fazer sorrir.
Das flores que tanto te comprei,
Dos nossos tantos planos! 
 Dos nossos beijos...

Bebo um gole de vinho,
Olho para as pessoas em volta,
Suspiro e olho para o chão.


Tudo acabou!
E como dói ser o último a saber...

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Odisseia Musical.

Havia cansado de ser um sonhador amargurado.
Sem sorte, acorrentado ao demérito passado.
Sozinho, vendo as plantas murcharem ao redor.
Resolvi transformar a poeira do tempo em suor.
Certo dia abri a janela, ouvi cidade adormecida.
E o silêncio que ecoava por cada rua e avenida.
E vi ali meu palco, e meu público tão disperso.
Corri de peito aberto e na rua me fiz submerso.
Andei por tantos litorais capturando só a beleza.
Cantei tudo aquilo mais alto, só para ter certeza.
Gastei a ponta dos meus dedos em corda de aço.
Criei calos nas mãos aperfeiçoando o meu traço.
Penei no compasso, e do bagaço de uma laranja.
Tentei cantar a força que a simplicidade esbanja.

Mas que valor isso tem aos teus ouvidos?

domingo, 24 de outubro de 2010

AS LAMENTAÇÕES DE UMA ARTE QUE MORREU

PRIMEIRO LAMENTO.

Essa arte veio da natureza,
Da força e da beleza
Era das artes a mais humana,
Bela fera hierática e profana.
Cantava ao povo, era viva.
Lágrima, suor e saliva.
Hoje, seu cadáver encarde,
Sob luzes e postes na rua,
Nessa cidade sem lua,
Onde o dia amanhece tarde.

 SEGUNDO LAMENTO.
Se a arte morreu de causas naturais
É porque o mundo estava virtual demais.
A artificialidade tem graça?
Veja os fogos de artifício.
Luz, barulho, cor e fumaça
E, no mesmo vazio do vício,
Não esquenta de verdade,
Mas queima até consumir tudo.
Quantidade vira qualidade,
E pobreza já é conteúdo,

TERCEIRO E ÚLTIMO LAMENTO.

Se a mataram não me admira!
Quantas vezes ela não foi mentira?
Ela já enfeitou muito bolero,
Mas cada enfeite foi sincero.
Era a arte da oferta irrecusável.
Era lobo em pele de serpente,
Entrava pela porta da frente
Com sua beleza incontestável.
Mas ao te ver em decomposição,
Tua canção já não escuto.
Linhas em branco, de luto,
De preto, juntando do chão
As lamentações de uma arte que morreu.
Morreu de medo suponho.
Com medo do tempo que esqueceu
A já saudosa arte do sonho.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Fidelitas

O vestido abraça o corpo
                                       Como quem sente saudade...                               
O batom corre pela boca
                                      Como quem preenche o vazio...
A porta fecha silenciosamente
                                             Como um ato de cumplicidade...


Amar é uma das poucas tarefas,
Que se tu não sabe fazer direito,
Alguém faz por ti.


E, como a pressa de quem tem sede,
Ela some, mas nos mostramos fiéis:
Eu finjo dormir, ela finge não ir...